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André Godoi
Depois de uma bela estréia com João Carrascoza, o EhDUCA não poderia perder o pique. Por isso dessa vez, eu e o Tucci entrevistamos André Godoi, redator da Giovanni, FCB. Além de ser ótimo com as palavras e capaz de frases, sacadas desconcertantes, o Pira (que é como eu o conheci nos tempos em que trabalhamos juntos na ETCO) é uma das pessoas mais carismáticas e sangue bom que já tive o prazer de conhecer. Gente boa mesmo, sem nenhuma frescurite. Simples, bem-humorado e com muito talento, ele começou como Atendimento na ETCO, e depois foi Redator na Propaganda Registrada, Bates Brasil e agora, como já dissemos, está na Giovanni,FCB. Graças a Deus e para o bem da propaganda, ele deixou a área de atendimento.
Com vocês, a primeira parte da entrevista com André Godoi, o grande Pira. Semana que vem, tem mais. Valeu! Raul Otuzi e Henrique Tucci.
Para começar, conta um pouco como você começou na carreira. Quando descobriu a vocação para a criação?
Conhece o Rodrigo Leão? Pois é, em janeiro de 2000, essa figura, diretor de criação da Propaganda Registrada, me ofereceu um estágio como redator.
– Mas, Rodrigo, eu sou atendimento do Magazine Luiza.
– Quando você começa?
– Dia 5.
Nunca tinha pensado em trabalhar na criação. Sério, não fazia a menor idéia de como se criava um anúncio. Talvez exatamente por isso ele tenha me dado a vaga. O certo seria chamar um estagiário ninja com um portfólio fodão debaixo do braço. Mas o Rodrigo deve ter pensado: "- Já tiveram essa idéia." Não acredito muito nesse troço de vocação.
Você não fez faculdade de publicidade e mesmo assim é um profissional de sucesso. O que você tem a dizer a respeito disso?
Ninguém aprende a criar numa sala fechada com um professor cagando regras na sua frente. Você até aprende muita coisa útil. Mas nada que um bom livro de propaganda não entregue também. Eu cursei economia e administração de empresas simplesmente por não fazer idéia do que eu realmente queria fazer da vida. No final das contas, a minha escola de verdade aconteceu do lado de fora do campus. Dentro da República Aurora (meu lar na época da faculdade), no bar em que eu era DJ (e garçom às vezes), no grupo de teatro e nas tantas roubadas que a gente se mete na vida. Não existe um método para criar. A palavra método não orna com criatividade. O que existe é uma postura criativa. Você só precisa de muita curiosidade, tesão e meia dúzia de neurônios.
Criação para varejo. Qual a sua experiência e opinião sobre o assunto?
Na Registrada, o job mais mico era uma conta de varejo: concessionária de carros. O cliente era tosco, não tinha prazo e ninguém queria fazer. Ótimo. Ninguém quer? Eu quero. Me dá aqui. Todos. Resultado: o meu estágio acabou e se transformou em emprego. Fazer varejo é ducaralho. É dinâmico. Você cria e amanhã tá na rua. Você está o tempo todo aprendendo e se desafiando para criar algo realmente novo e relevante para o consumidor. A gente faz muito varejo aqui na Giovanni: Fiat, Intelig Telecom, Submarino, Disney. E os jobs de varejo são tratados com o mesmo carinho que os institucionais. Anúncio criativo da Nike, você vê em qualquer pasta de estudante. Agora, campanha do Supermercado Cavalinho boa, criativa e com resultado de vendas… aí não é pra qualquer pançudo.
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Um anúncio seu para a Harley Davidson foi para Cannes, como é a sensação de criar para uma das marcas mais desejadas do mundo e ainda por cima fazer bonito no maior festival de publicidade da Terra?
Tá na moda dizer que prêmio de criação só serve para massagear o ego dos criativos. Bom, pra mim funcionou um pouco diferente. No mesmo ano em que a campanha de Harley foi pra Cannes, eu tive a oportunidade de participar do festival como Young Creative. Foi sensacional ver um trabalho meu competindo com centenas de peças incríveis. É importante a gente se sentir assim. Motiva. Afina o critério. Faz você querer voltar logo pra agência e produzir campanhas mais fodonas. E é essencial até para mostrar para o cliente que ele acertou em aprovar aquela idéia ousada. Claro que não dá para avaliar um profissional de criação pelos prêmios que ele ganhou. Isso é passado. Nossa profissão é muito maior e mais complexa que isso. Aliás, se fosse depender dos prêmios que eu ganhei em propaganda, eu tava fodido.
Qual o posicionamento da Giovanni? O que ela tem de diferente das outras agências em que você trabalhou?
O grande diferencial da Giovanni atualmente chama-se: Fernando Campos, Valdir Bianchi (Diretores de Criação), Ulisses Zamboni (VP de Planejamento) e suas respectivas equipes. Uma agência de propaganda é feita de pessoas que criam. E não de escritórios moderninhos e computadores caros. Portanto, se você trabalha em uma agência, independente do departamento, e não usa a criatividade, fique esperto.
Como é a rotina da criação dentro da agência? O que é mais motivador nesse dia-a-dia?
Obrigado por usar a palavra rotina na pergunta. A rotina é a inimiga número 1 da criatividade. Rotina nos incentiva a ligar o automático e deixar a inércia fazer o serviço. Infelizmente, ainda não temos um modelo de agência no Brasil que tenha questionado isso. O mundo está na era da criatividade, e as agências brasileiras na era industrial, da linha de montagem fordiana. Temos que parar de grampear o briefing naquele maldito envelope pardo. Eu até hoje não entendi essa merda. Os donos de agência derrubaram as paredes dos escritórios, mas esqueceram de arrancar a burocracia de lá. E digo mais, só derrubaram as paredes por um único motivo: ficou mais barato. O que mais me motiva nesse dia-a-dia? É saber que os meus diretores de criação têm a mesma opinião que a minha sobre este assunto.
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Existe alguma mania, método, mantra que você evoca para criar?
Gosto muito do silêncio nessas horas. Com intervalos de muito barulho para relaxar.
Fale de algum hobby que você tem, e de como ele te ajuda a criar. Quando surge uma trava criativa, o que você faz?
Tá. Vou citar duas atividades que têm feito um bem danado pra mim: ioga e teatro. Na verdade, tudo o que a gente faz para se desligar do dia-a-dia, ajuda no processo criativo. Hobby, hobby mesmo, eu não tenho nenhum. Não coleciono selos, moedas, bonecos de chumbo e não tenho a menor aptidão para montar aviõezinhos da 2ª Guerra. Em relação à trava criativa, varia muito. Teve um caso clássico na Registrada em que o desespero me levou à padoca da esquina. Sim, eu tomei um rabo-de-galo às 9 da manhã. Não adiantou nada. Só me deu uma baita azia.